por Leonardo Giordano Publicado 21/02/2022 15:05 | Editado 21/02/2022 19:18
(Foto: Reprodução)
Contrariando o Governo Federal e seus representantes à frente da Secretaria Especial de Cultura, como Mário Frias e André Porciúncula, defendo insistentemente a continuidade e a potencialização das políticas de fomento à cultura, com destaque para as que estão neste momento em tramitação na Câmara dos Deputados: Lei Aldir Blanc 2 e Lei Paulo Gustavo.
No Brasil, o setor cultural emprega quase 5 milhões de trabalhadores e economicamente corresponde a cerca de 4% do PIB nacional. Com a pandemia de Covid-19, as atividades de público foram as primeiras a parar e ainda não voltaram em sua totalidade, o que comprometeu gravemente a sustentabilidade de quem vive do fazer artístico-cultural.
O impacto da pandemia no setor cultural foi devastador a nível mundial. De acordo com o relatório da Unesco, a pandemia fez a indústria cultural perder 10 milhões de postos de trabalho no mundo em 2020. No Brasil, uma pesquisa da FGV aponta que 86,6% das empresas tiveram queda de faturamento a partir de março de 2020, e 63,4% precisaram paralisar suas atividades devido à crise sanitária. Só em 2020, mais de 900 mil trabalhadores do setor cultural foram afetados pela pandemia, de acordo com o Ipea.
Vale lembrar que quando falamos em trabalhadores e empregos do setor cultural, trata-se de uma vasta diversidade de profissionais que vivem dessas atividades. São costureiras, produtores, seguranças, artesãos, atores, músicos, cenógrafos, maquiadores, cinegrafistas, assistentes, iluminadores, entre muitos outros. Estamos falando de todo emprego e renda que um festival, um show, um centro cultural, um filme ou uma peça de teatro geram, de forma direta e indireta.
Em 2020, a ampla mobilização dos trabalhadores do setor cultural, que pressionou o Congresso Nacional, obteve uma vitória histórica: a Lei Aldir Blanc (LAB), que destinou 3 bilhões de reais ao setor, em caráter emergencial – a maior descentralização de recursos na história das políticas culturais do País. Como resultado, a LAB recuperou cerca de 870 mil postos de trabalhos perdidos na Covid-19, impactando positivamente mais de 4.100 municípios, que receberam a verba e puderam amparar diretamente trabalhadores, coletivos e instituições.
Neste momento, a Lei Paulo Gustavo e a LAB 2 estão na pauta da Câmara dos Deputados, em Brasília, e podem ser votadas a qualquer momento. As duas propostas são fundamentais para a retomada econômica e produtiva do setor cultural. O PLP 73/21, conhecido como Lei Paulo Gustavo – em homenagem ao ator, diretor e comediante que faleceu em razão da Covid-19 –, prevê a liberação de mais de 3 bilhões de reais para o setor. Esse valor virá do Fundo Nacional de Cultura e tem como fonte principal o Fundo Setorial do Audiovisual, que está contingenciado. A União deve enviar os recursos a estados e municípios para que sejam destinados a ações emergenciais de combate aos efeitos da pandemia. Trata-se, assim, de uma lei emergencial, que tem fontes próprias para seu orçamento.
Já o PL 1.518/21, conhecido como Lei Aldir Blanc 2, é a continuidade da ação de 2020 e tem como proposta uma política permanente e estruturante para o setor. A LAB 2 prevê o aporte de 3 bilhões de reais, oriundos do Orçamento federal, para serem destinados a estados e municípios. De acordo com o PL, os recursos podem ser aplicados para diversas ações do fazer artístico, como produção e aquisição de obras, realização de exposições, festivais, prêmios, entre outros. Chegando ao ponto: por que a aprovação dessas leis é fundamental? Porque esses investimentos estimulam a retomada cultural, recuperam postos de trabalho, auxiliam na manutenção de projetos e, acima de tudo, mantêm viva a produção cultural brasileira.
A gente já sabe que a base do governo é contrária à aprovação das leis. Em meio a um projeto de desmonte da cultura por parte do governo Bolsonaro, que começou lá atrás com a extinção do Ministério da Cultura, mais do que nunca é necessária a mobilização de toda a população para a aprovação das iniciativas. São trabalhadores que dependem das atividades culturais para sustentar suas famílias. É um setor que movimenta a economia e precisa de políticas de fomento descentralizadas e contínuas. E, além de tudo, cultura é a memória, a identidade e a história do nosso povo, que não pode ser silenciada, apagada e atacada por aqueles que temem o poder e o saber do povo. Pois, como sabemos, a cultura é o melhor antídoto contra a indiferença, contra o autoritarismo e a ignorância. A cultura é um direito, e é papel do poder público garantir isso à população. Somente com investimento e políticas públicas estruturantes conseguiremos avançar na recuperação do setor cultural pós-pandemia.
Leonardo Giordano é secretário das Culturas de Niterói, Rio de Janeiro.
Artigo publicado originalmente na CartaCapital
Fonte: Portal Vermelho.
22/02/2022